Durante meus poucos anos de treinamento, resistidos com pesos, não foram as lesões, não foram as dores nos ombros que pesaram, não foram os pulsos torcidos que me chatearam mais, foi sentir e ouvir diariamente o preconceito das pessoas.
Li esses dias em uma biografia do Arnold (The Education of a Bodybuilder), uma parte em que falava sobre mulheres; sobre as que não gostam de “caras fortes”, ou mesmo as que gostam. Ficamos tão taxados de agressivos, brutos, ignorantes ou até mesmo de quem tem um desempenho sexual fantástico, mesmo sendo várias as condições que influenciam nisso, como paixão, conexão, intimidade, entre outras, inúmeras.
Não bastando o lado afetivo, o preconceito atinge aspectos sociais, profissionais, comportamentais, relacionamentais e todos os “ais” possíveis e imagináveis.
O que há por trás de um cara com um físico de porte considerável ?
Por trás dele existe determinação, disciplina, força de vontade, paixão, superação, companheirismo, objetivos, todas as qualidades procuradas pelas pessoas.
Taxar alguém pelo seu volume muscular não seria tão igual ou pior do que taxar alguém pela estrutura física (magro, gordo), pela cor, pelo credo ou pela religião?
Rotular as pessoas é um hábito; por não saber direito quem somos, temos a necessidade de encaixar tudo em um rótulo. Poderia falar dos estereótipos, das piadinhas de familiares, amigos e companheiros de trabalho, ou da má fama, mas eu quero falar do desmerecimento por alguém que dedica dias, semanas, meses, anos de sua vida; que se priva de festas, bares, rodízios, churrascos; alguém que se esforça pra poder pagar, além da academia (o que é muito caro em Brasília), alimentação, suplementação, médicos, ortopedistas, remédios, equipamentos; alguém que se esforça para conciliar os treinos com a vida pessoal, com os amigos, a família, a namorada que fala que você só pensa em treinar; alguém que estuda e se especializa na área, em um país que paga mal aos seus profissionais e que tem pouquíssimos especialistas sérios no assunto, o que, infelizmente, nos torna alvo do desconhecimento gerador de todos os comentários e as discriminações. Alguém que, faça chuva ou sol, na hora do almoço, de madrugada, ou às 6:00 da manhã se levanta para treinar. Alguém que, para poder bancar tudo isso, tem que trabalhar muito, estudar e ainda arrumar tempo para se alimentar, treinar e descansar.
Conciliar tudo para não ter nenhum mérito, ou para que esse mérito seja destruído por comentários do tipo “ele toma bomba” de um total leigo, que não se esforça nem para se levantar do sofá e trocar o canal da televisão, pois tem um controle remoto na mão, assistindo ao filme “TRÓIA”, estrelado por Brad Pitt, e admirando: “Nossa como ele é forte!”. Para não ter reconhecimento, principalmente em Brasília, onde há pouco tempo não havia sequer federação ou incentivo ao “ESPORTE”, sim esporte!
Musculação é para muitos uma desculpa para fazer amigos ou desfilar com seu tênis da moda, como nas novelas, e com suas camisetas DryFit, com “última tecnologia para absorção de suor”; para mostrar a todos seus aparatos tecnológicos como relógios, tênis com absorção de calor, de impacto, impermeável, com 50 molas. Mas, para muitos, é mais que isso, é treino, sim, treino e não “malhar” pra ficar “sarado”, é coisa séria!
Esses são os anseios de um atleta amador. Podem parecer inatingíveis, utópicos, não só na musculação, como em qualquer esporte, mas são os anos de dedicação, passando por cima de todas as dificuldades, que trazem o merecimento.
Acreditar em si mesmo é essencial, como diria Arnold: “O sucesso na musculação pode te ensinar a ter sucesso em qualquer coisa na vida”.
Ainda não sou um competidor, sou um atleta amador que tenta defender o esporte (hoje em dia sou um competidor, de Fisiculturismo Natural); posso me considerar assim porque vivo esse esporte 24 horas por dia; posso fraquejar certas vezes, mas pra mim não se trata de um passatempo, envolve paixão, sonhos, talvez incompreendidos, mas as maiores coisas feitas pelo homem foram construídas com grandes sentimentos.
Talvez o sonho acabe hoje, amanhã… Mas saberei que consigo suportar desafios, e que posso enfrentar qualquer coisa com garra, determinação e paixão.
Autor: Gabriel Ortiz
Lembro da revista Super Treino. Essa é a vida de quem tem "sangue nos Oió", porque muitos treinam mas não querem abrir mão dessas coisas que todo mundo faz. Se pra quem se priva tá difícil, imagina pros outros. Ficam como cachorro correndo atrás do rabo até cansarem e pararem. É uma questão de escolha. Quanto ao preconceito, nunca sofri pelo tamanho, pois não sou grande, mas sofro por fazer dieta e não comer e beber como os outros.
Bacana que você já me acompanha há muito tempo, Flávio! Tamo junto!!! É uma vida difícil, mas gratificante!!!